TRILHANDO O CAMINHO DO MEIO - COMENTÁRIO SOBRE O 'SUTRA DO CAMINHO DO MEIO' - THICH NHAT HANH

 

Trilhando o Caminho do Meio – Comentário sobre o 'Sutra do Caminho do Meio' -Thich Nhat Hanh


Um dia, Buda perguntou ao monge Sona:
“É verdade que antes de se tornar monge você era músico?”
Sona respondeu que sim.

O Buda perguntou: “O que acontece se a corda do seu instrumento estiver muito frouxa?”
“Quando você dedilhar, não haverá som”, respondeu Sona.
“O que acontece quando a corda está muito esticada?”
“Vai quebrar.”

“A prática do Caminho é a mesma”, disse o Buda.

O Sutra do Caminho do Meio tem um significado profundo e maravilhoso. Mas somente quando descobrirmos como aplicar os ensinamentos contidos em nossa vida diária é que eles poderão ser verdadeiramente benéficos. Mesmo quando somos capazes de falar eloquentemente sobre o Caminho do Meio, o não-eu ou a Co-Origem Dependente, ainda precisamos perguntar: Como esses ensinamentos podem ser colocados em prática todos os dias?

A primeira maneira é perceber nosso apego aos próprios ensinamentos. Não apenas pontos de vista como permanência e eu precisam ser transcendidos, mas também a impermanência, o não-eu e o nirvana. O Buda diz que os ensinamentos são como uma jangada que nos ajuda a chegar à outra margem. Uma vez lá, deixamos a jangada na praia para uso de outras pessoas. Os ensinamentos, assim como a jangada, precisam ser liberados.

Diz-se que perto do fim da sua vida o Buda disse: “Em quarenta e cinco anos de ensino não disse nada”.


Na verdade, ele disse muitas coisas, mas não queria que seus ouvintes ficassem presos em suas palavras. Para facilitar a compreensão, falamos de ensinamentos como impermanência, não-eu e interser como visões corretas. Mas sabemos que estes são ensinamentos para nos ajudar, não são teorias.

Por exemplo, a noção de impermanência serve para nos ajudar a superar a noção de permanência; não é uma verdade a ser adorada. Os ensinamentos precisam ser tratados com habilidade para não ficarmos presos neles.

Ao apresentar os doze elos da origem dependente, o Buda diz que “a ignorância dá origem a impulsos”. “Ignorância” significa que não entendemos o que está acontecendo, então nos comportamos de determinada maneira. Se pudéssemos ver claramente, nos comportaríamos de maneira diferente.


Cada um de nós está preso, em maior ou menor grau, às nossas emoções, às nossas dificuldades e às nossas experiências de sofrimento no passado. Porque somos aprisionados, repetimos o mesmo sofrimento continuamente. Temos a energia do hábito de reagir às circunstâncias de maneira mecânica. Dizemos a nós mesmos que da próxima vez que isso acontecer não reagiremos da maneira antiga – como fizemos há duzentos anos.

Então, por que continuamos repetindo isso? Cada vez que nos comportamos assim, fazemos os outros sofrerem e nós mesmos sofremos.

Nossa energia do hábito é o que nos faz repetir o mesmo comportamento milhares de vezes. A energia do hábito nos leva a correr, a estar sempre fazendo alguma coisa, a nos perdermos em pensamentos sobre o passado ou o futuro e a culpar os outros pelo nosso sofrimento. E essa energia não nos permite estar em paz e felizes no momento presente.

A prática da atenção plena nos ajuda a reconhecer essa energia habitual. Cada vez que reconhecemos a energia do hábito em nós, somos capazes de parar e aproveitar o momento presente. A energia da atenção plena é a melhor energia para nos ajudar a abraçar a energia do hábito e transformá-la.

A energia da atenção plena é a plena consciência do momento presente. Essa energia é gerada a partir da prática de respiração consciente, caminhada consciente, bebida consciente, alimentação consciente e assim por diante. A energia da atenção plena carrega dentro de si a energia da concentração.


Quando você está atento a alguma coisa, seja essa coisa uma flor, um amigo ou uma xícara de chá, você fica concentrado no objeto da sua atenção plena. Quanto mais você está atento, mais concentrado você se torna. A energia da concentração nasce da energia da atenção plena. E se você estiver suficientemente concentrado, a energia da concentração contém a energia do insight.

Atenção plena, concentração e insight são as energias que constituem o Buda. Esses três tipos de energia podem transformar a energia do hábito e levar à cura e à nutrição.


Alguns dias praticando respiração consciente e caminhada consciente podem fazer uma grande diferença. E a prática deve ser agradável, não deve ser um trabalho árduo. Ao inspirar, você volta sua atenção para a inspiração. “Inspirando, eu sei que estou inspirando; inspirando, me sinto vivo.” Nessa respiração está a sua felicidade.

Sempre que surgem energias de hábito, podemos aceitá-las e reconhecê-las, e então elas não nos forçarão a nos comportarmos de maneira negativa. Podemos dizer à nossa energia do hábito: “Vou cuidar de você, energia do hábito, vou descobrir qual é a sua raiz”.

Thich Nhat Hanh – comentário sobre o Sutra do Caminho do Meio

Fonte:https://respireagora.com/2023/10/16/trilhando-o-caminho-do-meio-comentario-sobre-o-sutra-do-caminho-do-meiothich-nhat-hanh/

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