A NATUREZA DA MENTE É A MESMA PARA TODOS: SEGUNDO PEMA CHODRON É ISSO QUE SIGNIFICA SER HUMANO

 

 

                                                       Pema Chodron. 


A NATUREZA DA MENTE É A MESMA PARA TODOS




Uma das formas de agradecer a generosidade e bondade dos grandes seres de sabedoria é compartilhar e apoiar suas atividades. Dessa forma, ampliamos o alcance dos seus ensinamentos e os benefícios aos seres.

Uma das nossas iniciativas recentes foi oferecer um ciclo de estudos e práticas com livro “a beleza da vida”, de Pema Chodron. Para saber mais clique aqui 


Gryphus editora, a responsável pelos direitos autorais da obra em português, atendeu gentilmente o meu pedido para transcrever o primeiro capítulo do “A beleza da Vida”, da Pema Chodron, para os alunos do ciclo de práticas semanais na Roda do Darma.

Fomos além: disponibilizamos o primeiro capítulo aqui, na íntegra, mesmo para quem ainda não participa dos nossos encontros semanais.

Por favor, pedimos que o conteúdo desse post não seja reproduzido em apostilas e/ou outros materiais.

O livro está disponível para compra sob demanda e também em e-book pela editora Gryphus ou Amazon estante virtual.

NOTA: fiz algumas revisões pessoais na tradução abaixo, para facilitar o estudo. Você verá os termos em negrito com []* que sinalizam os termos que revisei e mantive o original no texto também. Coloquei subtítulos para para facilitar a leitura.


Cap.1 – A essencial ambiguidade de ser humano

“A vida é como entrar num barco que está para zarpar e afundar no mar.”

— Shunryu Suzuki Roshi

Como seres humanos, compartilhamos a tendência de bracejar por certezas sempre que percebemos tudo à nossa volta em fluxo. Em horas de dificuldade, o estresse de tentar encontrar terra firme — algo previsível e seguro em que ficar — se intensifica.

Na verdade, porém, a verdadeira natureza da nossa existência está eternamente em fluxo. Tudo está em constante mudança, estejamos cientes disso ou não. 

Que apuro! Parecemos condenados a sofrer simplesmente por termos um temor arraigado do modo como as coisas realmente são. Nossas tentativas de encontrar prazer e segurança duradouros ficam em conflito com o fato de sermos parte de um sistema dinâmico, no qual tudo e todos fazem parte do processo. 

Então é aí que nos encontramos: bem no centro de um dilema. E ele nos deixa com questões provocantes.

Como é que podemos nos entregar à vida, encarando a impermanência, sabendo que um um dia iremos morrer? Como é perceber que nunca poderemos, completa e finalmente, deixar tudo perfeitinho? Será possível aumentar nossa tolerância a instabilidade e mudança? Como podemos fazer amigos com a imprevisibilidade e a incerteza – e adorá-los como veículos de transformação das nossas vidas?

[A ambiguidade de ser humano]*

O Buda chamou de impermanência uma das marcas distintivas da nossa existência, um fato incontestável da vida. No entanto, parecemos resistir com toda força a isso.

Achamos que bastaria fazermos isso e não para fazer aquilo para, de algum modo, conseguirmos uma vida segura, digna de confiança e controlável. Ficamos muito decepcionados quando as coisas não saem bem do modo como planejamos. 

Não faz muito tempo, li uma entrevista com o correspondente de guerra Chris Hedges na qual ele usou uma expressão que me pareceu uma descrição perfeita da nossa situação: “a ambiguidade moral da existência humana.” 

Creio que isso se refere a uma escolha fundamental com que todos nos confrontamos: a de nos agarrarmos à falsa segurança de nossas ideias fixas e pontos de vista tribais, mesmo que isso só nos traga uma satisfação momentânea, ou de superar nosso medo e dar o salto para ter uma vida autêntica. 

Aquela expressão, “a ambiguidade moral da existência humana”, teve uma forte ressonância em mim porque é o que venho explorando há anos. Como é que podemos relaxar e ter uma relação autêntica, apaixonada com a incerteza essencial e a falta de chão, o desenraizamento de ser humano?

[A ansiedade essencial de ser humano] *

Meu primeiro professor, Chogyam Trungpa, costumava falar da ansiedade essencial de ser humano. Essa ansiedade ou mal-estar diante da impermanência é algo que aflige mais que uns poucos, é um estado que tudo permeia, sendo compartilhado pelos seres humanos.


Mas se, em vez de ficarmos abatidos com a ambiguidade e a incerteza da vida, aceitássemos e relaxássemos em meio a isso? E se disséssemos “Sim, é assim que as coisas são; é isso que ser humano significa”, e decidíssemos nos acomodar e aproveitar o passeio? 

Felizmente, o Buda deixou muitas instruções para que isso acontecessese realizasse. Entre elas encontra-se o que é conhecido na tradição do budismo tibetano como os Três Votos ou Três Compromissos. São três métodos para abraçar a natureza caótica, instável, dinâmica, desafiadora de nossa situação como caminho para o despertar. 

[Os Três Votos ou Três Compromissos como caminho para o despertar] *

primeiro compromisso, tradicionalmente denominado o Voto da Praimoksha, é o fundamento para a libertação pessoal. É o compromisso de fazer o melhor possível para não causar dano com nossas ações, palavras ou pensamentos, o compromisso de sermos bons uns com os outros.

Ele proporciona uma estrutura em que se aprende a trabalhar com nossos pensamentos e emoções e a se abster de falar e agir em resultado de confusão. 

O próximo passo para ficarmos confortáveis com o desenraizamento é o compromisso de ajudar os outros. Tradicionalmente denominado de Voto de Bodisatva, é o compromisso de dedicar nossas vidas a manter coração e mente abertos e a nutrir nossa compaixão com o desejo de atenuar o sofrimento do mundo. 

O último dos Três Compromissos, tradicionalmente conhecido como o Voto de Samaya, é a resolução de abraçar o mundo bem [tal]* como ele é, sem preconceito. É um compromisso de ver tudo que encontramos, bom e mau, agradável e doloroso, como uma manifestação da energia desperta. É o compromisso de ver todas as coisas como meios para podermos ficar ainda mais despertos. 

Mas o que significa a essencial ambiguidade de ser humano em termos da vida cotidiana? Acima de tudo, significa entender que tudo muda. Como Shantideva, mestre budista do século VIII, escreveu em The Way of Bodhisattva [O Caminho do bodisatva, ed. Makara]* : 

Tudo que posso e uso 

é como a visão fugaz de um sonho, 

Somo nos domínios da memória;

e, sumindo, não será mais visto. 

Quer estejamos conscientes ou não, o chão está sempre se movimentando. Nada dura, inclusive nós. É provável que haja muito poucas pessoas que, num momento ou outro, se preocupe com a ideia “Vou morrer”, mas há muitas evidências de que esse pensamento, esse medo nos persiga constantemente. “Eu também sou uma coisa breve e passageira”, observou Shantideva. 

[Qual a verdadeira causa do sofrimento humano]?*

Então, como é ser humano nesse estado ambíguo e improcedente? Antes de tudo, nos agarramos ao prazer e tentamos evitar a dor, mas, apesar de nossos esforços, estamos sempre alternando entre os dois.

Com a ilusão de que a segurança e o bem-estar constante representam o estado ideal, fazemos todo tipo de coisas para tentar atingi-lo: comemos, bebemos, nos drogamos, passamos horas online ou assistindo a TV.

Apesar disso, nunca atingimos o estado de satisfação inabalável que buscamos. De vez em quando nos sentimos bem: fisicamente não há dor e mentalmente tudo vai bem.

Então a situação muda e somos atingidos pela dor física ou angústia mental. Imagino que até seria possível fazer um gráfico da alternância de prazer e dor em nossas vidas, a cada hora, um dia após o outro, ano vem, ano vai, sendo que primeiro um predomina e depois o outro. 

A causa do nosso sofrimento não é a impermanência por si só, nem o fato de sabermos que vamos morrer, pensou o Buda, mas sim nossa resistência à incerteza essencial da nossa situação.

O desconforto surge de todos os nossos esforços para colocar um chão sob os pés, para realizar nosso sonho de estar constantemente bem. Quando resistimos à mudança chama-se sofrimento.

Mas, quando conseguimos entregar os pontos de vez e não lutar contra isso, quando conseguimos abraçar a falta de base da nossa situação e relaxar em sua qualidade dinâmica, chama-se iluminação, ou despertar para nossa natureza verdadeira, para nossa bondade essencial. Outra palavra para isso é liberdade – liberdade de luta contra a essencial ambiguidade de ser humano. 

[A raiz das tendências irrevogáveis] *

A essencial ambiguidade de ser humano indica que, por mais que queiramos, nunca podemos dizer: “Esse é o único caminho verdadeiro. É assim que é. Fim de conversa.” Em sua entrevista, Chris Hedges também falou sobre a dor resultante da insistência de um grupo ou religião de que seu ponto de vista é o verdadeiro. 

Como indivíduos, também, temos muitas tendências fundamentalistas e as usamos para nos reconfortar. Ficamos agarrados a uma posição ou crença num esforço de explicar direitinho a realidade, relutantes em tolerar a incerteza e o desconforto de ficar abertos a outras possibilidades. Seguramo-nos a essa posição como nossa plataforma pessoal e nos tornamos muito dogmáticos a respeito.  

A raiz dessas tendências fundamentalistas, dessas tendências dogmáticas, é uma identidade fixas – uma visão fixa que temos de nós mesmos como bons ou maus, importantes ou não, isso ou aquilo. Como uma identidade fixa, precisamos nos ocupar com a tentativa de reorganizar a realidade, pois ela nem sempre se adequa ao nosso ponto de vista. 

Quando vim para Gampo Abbey, eu me considerava uma pessoa apreciável, bondosa e de mente aberta. Parte disso era verdade, mas havia outra que não. Em primeiro lugar, eu era uma terrível diretora. Os outros residentes sentiam-se desabonados por mim.

[A dificuldade de estar aberta ao mundo]*

Eles apontavam meus defeitos, mas eu não conseguia ouvir o que diziam porque minha identidade fixa era muito forte. Cada vez que novas pessoas chegavam para morar no mosteiro, eu era alvo do mesmo tipo de opinião negativa, mas ainda não ouvia. Isso prosseguiu por alguns anos até o dia, como se todos eles tivessem se reunido para uma intervenção, em que finalmente ouvi o que todos me diziam sobre como meu comportamento os afetava. Enfim, a mensagem foi recebida.  

É isso que significa estar em negação: a pessoa não consegue ouvir nada que não se encaixe em sua identidade fixa. Mesmo algo positivo – a pessoa fez um ótimo trabalho ou tem um senso de humor maravilhoso – é filtrado por essa identidade fixa. A pessoa não consegue assimilar, a menos que já faça parte de sua autodefinição.

No budismo, chamamos a noção de uma identidade fixa de “apego ao ego”. É o modo pelo qual tentamos colocar solidez sob nossos pés num mundo em constante mudança. A prática da meditação começa a erodir essa identidade fixa. Ao sentar-se para meditar, a pessoa começa a se ver com mais clareza e percebe como se sente atraída pelas opiniões sobre si mesma. 

[A identidade fixa e o papel das crises]*

Geralmente, o primeiro golpe contra a identidade fixa é precipitado por uma crise. Quando as coisas começam a desmoronar na vida da pessoa, como aconteceu na minha quando vim para Gambo Abbey, a gente sente como se o mundo todo estivesse se esfarelando. Na verdade, porém, o que está se esfarelando é a sua identidade. E, como Chogyam Trungpa nos diz, isso é motivo para comemoração.

O propósito do caminho espiritual é desmascarar, retirar nossa armadura. Quando isso acontece, a sensação é de uma crise porque é uma crise – crise da identidade fixa. O Buda achava que a identidade fixa é a causa do nosso sofrimento. Olhando em maior profundidade, porderíamos dizer que a causa real do sofrimento é a incapacidade de tolerar a incerteza – e achar que é perfeitamente são, perfeitamente normal negar o desenraizamento essencial de ser humano. 

Apego ao ego é nosso meio de negação. Uma vez tendo a ideia fixa “isto sou eu”, enxergamos tudo como uma ameaça ou promessa – ou como algo que não nos importa nem um pouco. Seja o que for que se encontre, ficamos atraídos, sentimos aversão ou indiferença, dependendo do quanto isso representa uma ameaça a nossa autoimagem. 

A identidade fixa é nossa falsa segurança. Nós a mantemos filtrando todas as experiências através dessa perspectiva. Quando gostamos de alguém, geralmente é porque a pessoa nos faz sentir bem.

Ela não estraga nossa viagem, não perturba nossa identidade fixa, então somos amiguinhos. Quando não gostamos de alguém – a pessoa não está em nosso comprimento de onda, portanto, não queremos andar com ela – geralmente é porque ela desafia nossa identidade fixa.

Ficamos desconfortáveis na presença dela porque ela não nos reafirma do modo que queremos e assim não podemos funcionar do modo que desejamos. Muitas vezes pensamos nas pessoas de quem não gostamos como nossas inimigas, mas na verdade elas são importantíssimas para nós. São nossos maiores mestres: mensageiros especiais que aparecem bem quando necessitamos deles para que apontem para a nossa identidade fixa. 

[Shenpa: a medida de apego ao ego]*

O desconforto associado ao desenraizamento, à essencial ambiguidade de ser humano, origina-se no nosso apego de querer as coisas de um certo modo. A palavra tibetana para apego é shenpa.

Pema Chodron e Dzigar Kongtrul

Meu mestre Dzigar Kongtrul chama shenpa  de o barômetro do apego ao ego, uma medida do nosso autodesenvolvimento e autoimportância. Shenpa possui uma qualidade visceral associada ao segurar, ou, inversamente, ao afastar. Esse é o sentimento de eu gostoeu queroeu preciso e de eu não gostoeu não queroeu não preciso, eu quero isso longe.

Penso em shenpa como ser fisgado. É aquela sensação de estar imobilizado, aquele aperto, fechamento ou batida em retirada que experimentamos quando ficamos desconfortáveis com o que está acontecendo. Shenpa também é a urgência de encontrar alívio desses sentimentos por meio do apego a algo que nos dá prazer. 

Qualquer coisa pode desencadear nossos apegos: alguém que critique nosso trabalho ou nos olhe atravessado; o cachorro que mastiga nosso sapato favorito; quando derramamos algo na nossa melhor gravata. Num minuto estamos bem, no próximo algo acontece e de repente estamos fisgados por raiva, inveja, culpa, recriminação ou dúvida em nós mesmos. 

Esse desconforto, essa sensação de sermos acionados porque as coisas não estão “certas”, porque desejamos que durem mais ou que desapareçam, é a experiência sentida, a experiência visceral da essencial ambiguidade de ser humano.

Em sua maior parte, nosso apego, nosso shenpa, surge involuntariamente – é nossa reação habitual à sensação de insegurança.

Quando somos fisgados, nos voltamos para qualquer coisa que alivie o desconforto – comida, álcool, sexo, consumo, ficamos críticos ou grosseiros. No entanto, quando surge essa tensão, há algo mais proveitoso que podemos fazer.

Assemelha-se ao modo pelo qual podemos lidar com a dor. Uma forma popular de se relacionar com a dor física é a meditação da plena atenção [atenção plena, sati em sânscrito]*. Isso se faz direcionando toda a atenção para a dor enquanto se inspira e expira, tendo como base o ponto que dói.

Em vez de tentar evitar o desconforto, a gente se abre totalmente a ele. Fica-se receptivo à sensação de dor sem ficar residindo na história que a mente maquinou: é ruim; eu não devia me sentir assim; talvez nunca acabe.

Quando você entra em contato com o sentimento nervoso de shenpa, a instrução básica é a mesma dada para lidar com a dor física. Seja um sentimento de eu gosto ou não gosto, ou um estado emocional como solidão, depressão ou ansiedade, abra-se totalmente à sensação, livre de interpretação.

Se já tentou essa abordagem com a dor física, sabe que o resultado pode ser miraculoso. Quando você dá toda atenção ao joelho, às costas ou à cabeça – seja o que for que dói – e abandona o enredo, a trama, do bom/mau, certo/errado e simplesmente experimenta a dor de modo direto, nem que seja por um período curto, suas ideias sobre a dor e, geralmente, a dor em si mesma se dissolvem.

[Como superar o sofrimento de shenpa?]*

Shantideva dizia que o sofrimento que experimentamos com a dor física é inteiramente conceitual. Ele não se origina na sensação propriamente dita, mas no modo como a vemos. Ele usou o exemplo da Karna, uma seita da Índia antiga em que os membros se queimavam e se cortavam como parte da prática ritual.

Eles associavam a dor extrema ao êxtase espiritual, portanto ela tinha um significado positivo para eles. Muitos atletas experimentam algo semelhante quando “sentem a musculatura queimar”. A sensação física por si só não é boa nem má; é nossa interpretação dela que a deixa assim.

Isso me lembra de algo que aconteceu quando meu filho audacioso tinha uns 12 anos. Estávamos parados numa minúscula plataforma na proa de um navio – como Leonardo DiCaprio e Kate Winslet no filme Titanic – e comecei a descrever meu medo de altura. Disse-lhe que não sabia se poderia ficar ali, que estava tendo todo tipo de sensação física e que estava com as pernas moles.

Nunca irei me esquecer da expressão no rosto dele ao dizer: “Mãe, é bem assim que eu me sinto!” A diferença é que ele amava a sensação. Todos os meus sobrinhos e sobrinhas praticam bungee jump, exploram cavernas e curtem aventuras que eu evito a todo custo só porque tenho aversão ao mesmo sentimento que os entusiasma.

[Um minuto e meio com as emoções e apenas isso]*

No entanto, há uma abordagem que podemos adotar em relação à essencial ambiguidade de ser humano que nos permite trabalhar com sentimentos de medo e aversão, em vez de nos afastarmos deles. Se conseguirmos entrar em contato com a sensação como sensação e nos abrirmos a ela sem rotulá-la de boa ou má, até mesmo quando sentirmos o impulso de recuar, poderemos estar presentes e seguirmos adiante com a sensação.

Em A cientista que curou seu próprio cérebro [My Stroke of Insight], o livro da neurocientista Jill Bolte Taylor sobre sua recuperação de um grave AVC, ela explica o mecanismo fisiológico por trás das emoções: uma emoção como raiva que seja uma reação automática dura apenas 90 segundos desde o momento em que é desencadeada até seguir seu rumo. Um minuto e meio, só isso. 

Quando dura mais tempo, o que geralmente acontece, é porque preferimos reavivá-la. Poderíamos tirar vantagem da natureza mutável, cambiante, das nossas emoções. Mas tiramos? Não. Em vez disso, quando surge uma emoção, nós a abastecemos com nossos pensamentos e o que deveria durar um minuto e meio pode arrastar-se por dez ou vinte anos. Nós simplesmente ficamos reciclando o enredo. Ficamos fortalecendo nossos velhos hábitos.

A maioria das pessoas tem problemas físicos ou mentais que lhes causaram aflição no passado. E quando sentimos o sopro da aproximação de um deles – uma crise asmática incipiente, um sintoma de fadiga crônica, uma pontada de ansiedade – entramos em pânico. Em vez de relaxar com a sensação e deixar que ela cumpra seu minuto e meio enquanto ficamos totalmente abertos e receptivos a ela, dizemos: “Ah, não, ah, não, aqui está de novo.”

Nós nos recusamos a sentir a essencial ambiguidade quando ela chega dessa forma e então fazemos a coisa que será a mais prejudicial para nós: aumentamos a rotação dos nossos pensamentos a respeito. E se isso acontecer? E se aquilo acontecer? Revolvemos grande quantidade de atividade mental. Corpo, fala e mente ficam envolvidos na tarefa de escapar da sensação, o que só faz com que ela continue sem parar.

[Samsara]*

Podemos contrapor essa reação por meio do treinamento em estar presentes. Uma mulher que conhecia a observação de Jill Bolte Taylor sobre a duração das emoções enviou-me uma carta em que descrevia o que ela faz quando uma sensação de inquietude aparece. “Apenas faço o lance do minuto e meio”, escreveu ela.

Portanto, essa é uma boa instrução prática: quando você entrar em contato com o desenraizamento, um modo de lidar com essa sensação tensa de apreensão é “fazer o lance do minuto e meio”.

Reconheça a sensação, dê-lhe toda sua atenção compassiva, até acolhedora, e, mesmo que seja apenas por alguns segundos, abandone o enredo sobre a sensação. Isso lhe permitirá uma experiência direta, livre de interpretações. Não a abasteça com conceitos ou opiniões sobre se é boa ou má. Simplesmente fique presente na sensação.

Onde se localiza no seu corpo? Permanece igual por muito tempo? Ela muda de lugar e se modifica? Ego ou identidade fixa não significa apenas que temos uma ideia fixa sobre nós mesmos. Significa também que temos uma ideia fixa sobre tudo que percebemos. Eu tenho uma ideia fixa sobre você; você tem uma ideia fixa sobre mim. E uma vez que haja esse sentimento de separação, ele dá origem a emoções fortes.

No Budismo, emoções fortes, como raiva, ânsia, orgulho e inveja, são conhecidas como kleshas – emoções conflitantes que anuviam a mente. As kleshas são nosso veículo para fugir do desenraizamento e, assim sendo, cada vez que cedemos a elas, nossos hábitos pré-existentes são reforçados. No Budismo, esse andar em círculos, reciclando os mesmos padrões, é chamado de samsara. E samsara é igual à dor.

[O nosso trabalho diário é ausência de controle e o apego ao ego]*

Estamos sempre tentando escapar da essencial ambiguidade de ser humano, e não conseguimos. Não podemos fugir disso mais do que podemos fugir da mudança nem mais do que podemos fugir da morte. A causa do nosso sofrimento é nossa reação à realidade para a qual não há escape: apego ao ego e todos os problemas que se originam disso, todas as coisas que dificultam nossa sensação de conforto na própria pele e a possibilidade de nos darmos bem uns com os outros.

Se o modo de lidar com esses sentimentos é estar presente com eles sem abastecer o enredo, então isso requer a pergunta: como entrar em contato com a essencial ambiguidade de ser humano? Na verdade, não é difícil, pois uma inquietude subjacente costuma estar presente em nossa vida. É bem fácil reconhecer, mas não tão fácil interromper.

Podemos experimentar essa inquietude como qualquer coisa que vai de um ligeiro nervosismo ao puro terror. A ansiedade nos deixa vulneráveis, coisa que geralmente não apreciamos. A vulnerabilidade vem de várias formas. Podemos nos sentir desequilibrados, como se não soubéssemos o que está acontecendo, não conseguimos controlar as coisas. Podemos nos sentir sós, deprimidos ou irritados. A maioria das pessoas quer evitar emoções que as deixam vulneráveis, portanto fazem praticamente qualquer coisa que as afaste delas.

[Tomando as emoções como caminho para o despertar]*

No entanto se, em vez de pensar nesses sentimentos como maus, nós os considerarmos placas de estrada ou barômetros que nos avisam que estamos em contato com o desenraizamento, veríamos os sentimentos como realmente são: os portões para a libertação, uma porta aberta para a liberdade do sofrimento, o caminho para nosso mais profundo bem-estar e alegria.

Temos uma escolha. Podemos passar a vida toda sofrendo porque não conseguimos relaxar com o modo que as coisas realmente são, ou podemos relaxar e abraçar a flexibilidade da situação humana, que é fresca, não fixada, sem preconceito.

Portanto, o desafio é perceber o puxão emocional do shenpa quando ele surge e ficar com ele por um minuto e meio sem o enredo. Será que você pode fazer isso uma vez por dia ou muitas vezes, conforme o sentimento aparece? Esse é o desafio. Esse é o processo de desmascarar, de relaxar, de abrir a mente e o coração.

Fonte:https://rodadodarma.com.br/pema-chodron-e-isso-que-significa-ser-humano/

 

Comece com o coração partido – Pema Chödrön

por Gustavo Gitti

A editora Gryphus generosamente nos enviou o primeiro capítulo do novo livro de Pema Chödrön, Acolher o indesejável (tradução de “Welcoming the unwelcome: wholehearted living in a brokenhearted world“), que já estamos usando como base para algumas práticas na comunidade olugar.org e talvez estudemos no ano que vem, assim como fizemos longamente com o livro Quando tudo se desfaz. É um ensinamento sobre o bodhichitta, a intenção altruísta que converge a mente livre da sabedoria e o coração aberto da compaixão. Deixamos abaixo na íntegra. Desfrute!

Ao se ocupar de ensinamentos espirituais, é bom ter conhecimento das suas intenções. Por exemplo, você pode questionar: “O que estou querendo ao ler este novo livro com seu título sinistro Acolher o Indesejável?” Está lendo porque os tempos estão incertos e você quer algumas pistas do que pode lhe ajudar  a atravessar o que vem pela frente? Está lendo para adquirir sabedoria sobre si mesmo? Espera que ele o ajude a superar certos padrões mentais que prejudicam seu bem-estar? Ou ganhou-o de presente – com muito entusiasmo – e agora não quer entristecer a pessoa que o presenteou, deixando de lê-lo?

Seus motivos podem incluir alguns ou todos acima. São todas boas razões (até a última) para que você leia este ou qualquer livro. Mas, na tradição do Budismo Mahayana, à qual eu pertenço, ao estudar os ensinamentos espirituais, estipulamos uma motivação ainda maior, conhecida como bodhichitta. Em sânscrito, bodhi significa “desperto” e chitta “coração” ou “mente”. Nosso objetivo é despertar coração e mente de modo pleno, não apenas para nosso maior bem-estar, mas também para levar benefício, consolo e sabedoria a outros seres vivos. Que outra motivação poderia ser superior?

O Buda ensinou que todos nós, em essência, somos bons e amorosos. Devido a essa bondade básica, naturalmente queremos apoiar os outros, em especial aqueles de quem somos próximos e aqueles que passam por maiores necessidades. Temos uma intensa consciência de que outros precisam de nós, assim como nossa sociedade e o planeta como um todo, especialmente agora. Queremos fazer o que pudermos para aliviar o medo,  a raiva e o doloroso desamparo que muitos experimentam hoje em dia. Entretanto, o que muitas vezes atrapalha, quando tentamos ajudar, é que nos deparamos com nossa própria confusão e tendências habituais. Ouço dizer: “Eu queria ajudar adolescentes vulneráveis, então fui estudar, me preparar e parti para a assistência social. Dois dias no trabalho e descobri que odiava a maioria dos garotos! Meu primeiro sentimento foi: ‘Por que não podemos simplesmente nos livrar de todos esses garotos e encontrar uns mais legais, que colaborem comigo?’. Foi então que percebi a necessidade de consertar o que havia de errado em mim mesmo.”

Bodhichitta, ou coração desperto, começa pelo anseio de nos livrarmos de qualquer coisa que nos atrapalhe, no intento de ajudar os outros. Desejamos nos livrar de nossos pensamentos confusos e padrões habituais que encobrem nossa bondade essencial, inata, de modo a sermos menos reativos e menos presos ao nosso antigo modo de ser. Compreendemos que, ao irmos além, seja em que grau for, de nossas neuroses e hábitos, conseguiremos ficar mais disponíveis para aqueles adolescentes, para nossos familiares, para a comunidade como um todo ou para os estranhos que encontramos. Interiormente, talvez ainda estejamos passando por fortes sentimentos e reações, mas, se soubermos como trabalhar essas emoções, sem cair em nosso padrão de comportamento, estaremos nos disponibilizando para os demais. E, mesmo que não haja nada substancial que possamos fazer para ajudar, as pessoas sentirão nosso apoio, o que ajuda muito.

Bodhichitta começa com essa aspiração, mas não para por aí. Bodhichitta também é um compromisso. Nós nos comprometemos a fazer tudo que for preciso para nos livrarmos completamente de todas as variantes de confusão, hábitos inconscientes  e sofrimentos que nos assolam, pois isso nos impede de estar disponíveis para os outros. Na linguagem do budismo, nosso compromisso máximo é atingir a “iluminação”. Em essência, isso significa saber quem realmente somos. Uma vez iluminados, estaremos totalmente ligados à nossa natureza mais profunda, que é fundamentalmente franca e generosa, compreensiva e disponível ao próximo. Saberemos que isso é verdadeiro, sem qualquer dúvida, sem nenhum retrocesso. Nesse estado, possuiremos o máximo possível de sabedoria e habilidade, que nos possibilitarão beneficiar os outros e ajudá-los a despertar de modo pleno.

Para preencher o compromisso de bodhichitta, precisamos aprender tudo o que há para aprender sobre nosso coração e nossa mente. É um grande trabalho. Provavelmente teremos que ler livros, ouvir ensinamentos e refletir profundamente sobre o que estudamos. Com uma prática regular de meditação sentada, também aprenderemos muito a nosso respeito. No final do livro incluí uma técnica simples de meditação, que pode ser usada em qualquer lugar. Por fim, precisaremos testar e esclarecer nosso conhecimento crescente, aplicando-o às nossas vidas, às situações em que nos encontramos naturalmente. Quando o bodhichitta se torna a base para nosso modo de viver cotidianamente, tudo que fazemos fica significativo. Nossa existência torna-se incrivelmente rica. É por isso que faz todo sentido nos lembrarmos de bodhichitta sempre que possível.

Às vezes, as maravilhosas motivações de bodhichitta afloram facilmente, mas quando estamos ansiosos ou preocupados conosco, quando nosso grau de autoconfiança está baixo, bodhichitta pode parecer além do nosso alcance. Nessas fases, o que podemos fazer para animar nosso coração e gerar o anseio corajoso de acordar para o benefício alheio? O que podemos fazer intencionalmente para dar meia-volta em nossa mente, quando ela está se sentindo pequena?

Meu primeiro mestre, Chögyam Trungpa Rinpoche, ensinou-me um método para mudar o curso da mente, que eu ainda sigo. A primeira coisa a fazer é lembrar de uma imagem ou história comovente, algo que aqueça naturalmente seu coração e o ponha em contato com as aflições humanas. Talvez alguém que você conheça tenha sido diagnosticado com câncer ou uma doença degenerativa. Ou uma pessoa querida, que tenha problemas com drogas ou álcool e estava bem por muito tempo, acabou de ter uma recaída. Ou, quem sabe, um amigo íntimo tenha sofrido uma grande perda. Talvez você tenha visto uma cena triste quando foi ao mercado, como uma interação dolorosa entre pai, ou mãe, e filho. Você pode também pensar na mulher sem teto que sempre vê a caminho do trabalho. E tem aquela notícia que leu ou a que assistiu, uma reportagem sobre fome ou sobre a deportação de uma família.

Trungpa Rinpoche dizia que o modo de despertar bodhichitta era “começar com o coração partido”. Proteger-se da dor – nossa ou alheia – nunca funcionou. Todos querem se livrar do sofrimento, mas a maioria das pessoas age de modo a somente piorar as coisas. Proteger-se da vulnerabilidade de todos os seres vivos – incluindo a nossa própria – nos aliena da experiência completa da vida. Nosso mundo encolhe. Quando nossos principais objetivos são adquirir conforto e evitar desconforto, começamos a nos sentir desligados dos demais e até ameaçados por eles. Assim nos encerramos num emaranhado de medo. E, quando muitas pessoas e países adotam esse tipo de abordagem, o resultado é uma situação global conturbada, cheia de dor e conflito.

Ao fazermos tanto esforço para proteger o coração da dor, nos machucamos cada vez mais. Mesmo ao percebermos que isso não ajuda, é um hábito difícil de romper. Trata-se de uma tendência humana natural. No entanto, quando geramos bodhichitta, contrariamos essa tendência. Em vez de nos esquivarmos, despertamos a coragem de olhar francamente para nós mesmos e para o mundo. Em vez de sermos intimidados pelos fenômenos, passamos a abraçar todos os aspectos de nossas vidas inesgotavelmente ricas.

É possível acessar bodhichitta ao simplesmente nos permitir a vivência de nossos sentimentos brutos, sem sermos sugados por nossas ideias e histórias a respeito deles. Quando me sinto só, por exemplo, posso culpar a mim mesma ou fantasiar sobre as delícias de ter uma companhia. Mas tenho também a oportunidade de simplesmente tocar naquele sentimento de solidão e descobrir que bodhichitta está bem ali, no meu coração vulnerável. Posso perceber que minha solidão não difere daquela que todos os outros sentem neste planeta. Da mesma forma, meus sentimentos indesejados, de estar sendo deixada de lado ou acusada injustamente, podem me conectar com todos aqueles que estão sofrendo dessa mesma maneira.

Quando me sinto constrangida, fracassada, quando sinto que algo está fundamentalmente errado comigo, bodhichitta está presente nessas emoções. Quando cometi um grande erro, quando fracassei e não fiz o que havia me disposto a fazer, quando sinto a ferroada de ter decepcionado todo mundo – nessas horas tenho a opção de mobilizar o coração desperto de bodhichitta. Se eu de fato meconecto com minha inveja, raiva ou preconceito, estou me colocando no lugar de toda a humanidade. A partir desse ponto, o anseio de despertar para aliviar o sofrimento do mundo vem naturalmente.

Há uma longa história de pessoas que conseguiram desvelar sua bondade e coragem inatas através de uma prática dedicada. Algumas delas são figuras religiosas famosas, mas a maioria não é conhecida, como meu amigo Jarvis Masters, que está num presídio da Califórnia há mais de trinta anos. Nem sempre estaremos inspirados a seguir esses exemplos e ir destemidamente contra   a corrente. Nossa autoconfiança irá oscilar. E os ensinamentos nunca nos dirão para dar um passo maior que as pernas. No entanto, se aumentarmos gradativamente nossa capacidade de estar presentes com nossa dor e com os sofrimentos do mundo, uma sensação cada vez maior de coragem irá nos surpreender.

Na prática de cultivar um coração partido, conseguimos criar a força e a habilidade necessárias para abarcar cada vez mais. Trungpa Rinpoche, que tinha enorme capacidade de enfrentar o sofrimento sem lhe dar as costas, sempre recordava de uma vez, no Tibete, quando ele tinha cerca de oito anos de idade. Ele estava no telhado de um mosteiro e viu um grupo de meninos apedrejando um filhote de cachorro até a morte. Apesar da distância, ele conseguia ver o olhar apavorado do cachorrinho e ouvir as risadas dos meninos, que faziam aquilo para se divertir. Rinpoche queria fazer algo para ajudar o cachorro, mas não era possível. Pelo resto da vida, bastava ele se lembrar daquele momento para sentir no coração um forte desejo de aliviar o sofrimento. A lembrança do cachorrinho incitava urgência ao seu desejo de despertar. Foi isso que o impulsionou a diariamente fazer o melhor uso de sua vida.

A maioria das pessoas, de um modo ou de outro, tenta fazer  o bem. É um resultado natural da nossa bondade inata. No entanto, nossas motivações positivas muitas vezes se misturam a outros fatores. Algumas pessoas, por exemplo,  tentam  ser úteis porque se sentem mal consigo mesmas. Então esperam dar uma boa impressão aos olhos do mundo. Através de seus esforços, esperam aumentar o prestígio com os outros, o que então poderá aumentar sua autoestima. Baseada em minha longa experiência de viver em comunidades, posso dizer que essas pessoas costumam realizar um volume impressionante de coisas. Ouve-se dizer: “A Maria vale por seis”, ou “Como eu queria que todo mundo fosse como o Jordan”. Na maioria dos casos, são essas pessoas que você quer na sua equipe. Mas, ao mesmo tempo, elas não parecem próximas do despertar. Acho que todos conhecem alguém que diz coisas como “Eu vivo dando de mim e nunca me agradecem!” Esse tipo de frustração é um sinal de que questões subjacentes não estão sendo trabalhadas.

Algumas pessoas trabalham muito, dia e noite, ajudando o próximo, mas sua motivação mais forte é a de ocupar-se para não sentir a própria dor. Algumas são movidas pela ideia de serem “boas”, incutida pela família ou cultura. Outras, por sentimentos de obrigação ou culpa. Algumas fazem o bem para ficarem longe de confusões. Outras são induzidas pela perspectiva de recompensas, nesta vida ou talvez numa existência futura. Algumas são até motivadas por ressentimento, raiva ou necessidade de controle.

Se dermos uma boa olhada para dentro, talvez descubramos que motivações desse tipo se misturam ao nosso desejo genuíno de ajudar o próximo. Não devemos nos flagelar em relação a isso, porque todas essas motivações vêm da nossa tendência humana de buscar a felicidade e evitar a dor. Contudo, elas nos impedem de ter uma conexão maior com nosso coração e com o do próximo, o que dificulta mais profundamente nossa capacidade de beneficiar os outros.

Em contrapartida, a motivação de bodhichitta leva a resultados mais profundos e duradouros, porque se baseia no entendimento da origem do sofrimento. No plano exterior, há o sofrimento imenso que vemos ou de que somos informados e que pode nos atingir de vez em quando – crueldade, fome, medo, abuso e violência, que castigam pessoas, animais e o próprio planeta. Tudo isso se origina de emoções como ganância e agressividade, que por sua vez têm origem na falta de entendimento da bondade inata da nossa verdadeira natureza. Essa ignorância está na raiz de todo nosso sofrimento. Está por trás de tudo que fazemos para prejudicar a nós mesmos e aos demais. Quando acordamos bodhichitta, nos comprometemos a superar tudo que obscurece nossa sabedoria interior e amabilidade, tudo que nos separa de nossa capacidade natural de nos identificar com os outros e beneficiá-los.

Esse despertar para nossa verdadeira natureza não acontece da noite para o dia. E, mesmo quando começamos a despertar e nos encontramos cada vez mais aptos a ajudar o próximo, é preciso aceitar que nem sempre podemos fazer algo – pelo menos não de imediato. Sem arrumar desculpas ou sucumbir à indiferença, precisamos reconhecer que é assim que as coisas são. Inúmeras pessoas e animais sofrem neste instante, mas o quanto podemos fazer para impedir isso? Se estivermos no telhado de um mosteiro, vendo meninos apedrejando um filhote de cachorro, talvez naquele momento só nos reste ficar ali, não dar as costas e deixar que aquela tragédia aprofunde nosso bodhichitta. Depois, podemos nos permitir a curiosidade de saber o que faz com que pessoas machuquem animais. Em vez de considerar o comportamento dos meninos como algo alheio a nós, podemos buscar suas raízes dentro de nós mesmos. Será que a agressividade e a cegueira por trás de tais atitudes residem em nosso coração? Se conseguirmos encontrar um denominador comum dessa forma, talvez estejamos em melhor posição de comunicação na próxima vez em que nos depararmos com algo similar. E, quando despertarmos completamente para nossa verdadeira natureza, teremos uma capacidade muito maior de influenciar os outros. No entanto, mesmo assim, o que podemos fazer para ajudar estará limitado pelas circunstâncias.

Portanto, ao acordarmos bodhichitta, é importante saber que é um projeto de longo prazo. Teremos que fincar pé por muito tempo e investir enorme esforço e paciência. A visão suprema de bodhichitta é a de ajudar cada ser vivo a despertar para sua verdadeira natureza. Nossa única chance de realizar isso é primeiramente atingindo nossa própria iluminação. Ao longo do caminho, podemos dar um passo de cada vez, dando nosso melhor para manter o anseio e comprometimento durante os altos e baixos da vida.

Ao ler este livro, por favor, tente focar no contexto mais amplo de bodhichitta. Isso será muito mais proveitoso do que ler para obter estímulo intelectual. Se você começar com o coração partido, com um coração que anseia em ajudar o próximo, é possível que descubra algumas coisas aqui e as leve para sempre. Entre todas as palavras deste livro, pode haver um parágrafo ou uma frase – talvez algo cuja importância eu nem tenha percebido – que entrará em plena sintonia com você. Alguma coisa pode mudar sua perspectiva e realmente aproximá-lo da capacidade de aliviar o sofrimento no mundo.

Estes ensinamentos não são simplesmente ideias minhas. São minha tentativa de transmitir a sabedoria que recebi dos meus mestres, que a receberam dos mestres deles e assim por diante, numa linha de sábios que remonta a milhares de anos. Se você os encarar com a motivação de bodhichitta, não há limite para o benefício que podem trazer. Quando estamos verdadeiramente ligados ao anseio de ajudar o próximo e comprometemos nossas vidas a esse propósito, podemos nos considerar incluídos entre os mais afortunados sobre a Terra.

Acolher o indesejável

Nos últimos sete anos, Pema Chödron praticou vigorosamente, reduzindo sua agenda de ensinamentos, sem lançar nenhum livro. Em Acolher o indesejável, recebemos conselhos e práticas cotidianas que evidenciam ainda mais a profundidade de sua realização, além de nos sentirmos muito íntimos de sua vida, a cada história pessoal compartilhada. Deixamos aqui o PDF das páginas iniciais para você ter um vislumbre do livro pelo sumário.

Você pode adquirir o livro impresso no site da editora Gryphus (recomendamos para apoiar o trabalho delas!). E a edição digital no Apple Books ou para Kindle na Amazon.

O estudo do livro Quando tudo se desfaz: orientação para tempos difíceis, também de Pema Chödrön, durou 13 semanas, foi todo gravado e está disponível em vídeos e áudios para quem entrar agora na comunidade. Há participantes fazendo esse estudo atualmente. Também exploramos as práticas da compaixão no estudo de Um coração sem medo, de Thupten Jinpa, e recentemente no ciclo “Mãos e olhos”, com a participação de Roshi Joan Halifax com dois ensinamentos em vídeo sobre bodhicitta, também inteiro disponível. Se tiver interesse, pode entrar diretamente em olugar.org ou nos escrever: coordenacao@olugar.org

Fonte:https://olugar.org/comece-com-o-coracao-partido-pema-chodron-bodhicitta/

Gustavo Gitti

Coordenador do lugar, professor de TaKeTiNa e praticante budista | gustavogitti.comhttps://olugar.org


A NATUREZA DA MENTE É A MESMA PARA TODOS


Pema Khandro e Jetsunma Tenzin Palmo (atual presidenta da organização Sakyadhita International), na 14º Conferência Internacional Sakyadhita.  Foto: Olivier Adam.

 

Ven. Karma Lekshe provoca mulheres a superarem qualquer hesitação e se tornarem o que já são: budas

Revista Bodisatva > Sabedorias > Ensinamentos > A natureza da mente é a mesma para todos

 

Em décadas recentes, a atenção dada ao tema das mulheres no budismo expandiu dramaticamente. Desde os anos 1960, este interesse tem crescido exponencialmente por todo o mundo graças aos grandes professores budistas, às pesquisas e publicações sobre o budismo em línguas modernas, à internet, ao crescimento de centros educacionais budistas de excelência, e também graças a uma abundância de vibrantes atividades budistas ligadas ao serviço social. Especialmente em países ocidentais, os ensinamentos do Buda sobre paz, compaixão, ética e psicologia humana tiveram um impacto significativo. O pensamento e a cultura budistas têm permeado a cultura ocidental de forma marcante, da religião à política, da arte ao mercado de consumo.

Essa nova onda de interesse pelo budismo coincidiu com novas oportunidades educacionais e profissionais para mulheres e com um olhar crescentemente consciente sobre suas capacidades e potenciais. Ainda assim, infelizmente, mulheres nem sempre têm acesso a uma educação budista, nem são representadas de forma igualitária em instituições budistas.

Apesar de o Buda ter ensinado o caminho para a liberação para benefício de todos os seres, reconhecimento completo e oportunidades iguais não são estendidos às mulheres em muitas tradições budistas. Se os ensinamentos do Buda são liberadores, eles não deveriam ser igualmente liberadores para mulheres e homens?

A resposta para esta pergunta é francamente óbvia. Os ensinamentos budistas falam sobre a natureza da mente e sobre como purificar as delusões que a enevoam, de forma a alcançar paz e felicidade duradouras. A natureza da mente — que é a consciência pura — é a mesma para mulheres e homens. O potencial humano para dissipar a delusão e alcançar a felicidade perfeita também é idêntico para mulheres e homens. Isto significa que os ensinamentos do Buda são igualmente liberadores, tanto para mulheres quanto para homens.

Então, por que na história do budismo a maior parte das histórias sobre seres realizados é sobre homens? Se todos os seres humanos podem praticar os ensinamentos do Buda e tornarem-se livres de apego, raiva e ignorância, por que não temos mais histórias sobre mulheres realizadas? Se todos os seres vivos têm o potencial de se liberar do sofrimento, por que não ouvimos mais sobre mulheres atingindo a liberação?

Em anos recentes, essas questões conduziram acadêmicos budistas e praticantes a reflexões e pesquisas sérias sobre o papel e o potencial da mulher no budismo. Muitos novos livros têm surgido sobre mulheres na história budista, bem como em tradições budistas contemporâneas. Muitos livros têm sido escritos por autoras mulheres sobre sua prática e seus insights acerca dos ensinamentos do Buda.

A monja americana budista Pema Chodron, uma das mais populares escritoras budistas dos nossos dias, tem aparecido em muitas diferentes mídias, desde a revista Newsweek até o programa de televisão Oprah Show. Seus livros têm se tornado uma grande influência entre pessoas de todas as religiões e entre aquelas sem religião alguma. Muitos estudos documentam como as mulheres estão assumindo novos papéis em organizações budistas e tornando-se professoras budistas extremamente respeitadas, sobretudo em países ocidentais. Mas a questão que continua é: o que ainda está fazendo as mulheres budistas hesitarem?

Superando a hesitação

Para budistas sensatos, a resposta é fácil. Como o Buda ensinou, nós precisamos reconhecer e eliminar as fontes do sofrimento humano: avareza, raiva e ignorância. Se conseguirmos identificar as causas raiz desses problemas — tanto enquanto indivíduos como enquanto sociedade — nós teremos uma boa chance de transformar o mundo e alterar o curso da história humana. Mas avareza, raiva e ignorância não desaparecerão sem que haja esforço. Ou seja, nós precisamos estudar e praticar os ensinamentos budistas — sincera e intensamente — para sermos realmente capazes de mudar as coisas. Precisamos de ensinamentos e precisamos de professores para ensiná-los! Mas talvez seja ainda mais importante o fato de que precisamos de pessoas que sejam exemplos vivos de valores budistas e que possam servir como fontes de inspiração para outros. Precisamos de professores budistas qualificados que tenham desenvolvido um coração de compaixão, sabedoria suficiente e métodos de ensino habilidosos para motivar outras pessoas no caminho. É triste, mas parece haver uma carência de professores inspiradores no mundo de hoje.

O Buda foi um grande exemplo, e continua a inspirar milhões de pessoas até hoje! Ao deixar para trás sua vida cheia de luxo no palácio e colocar em marcha a descoberta do sentido da existência humana, ele demonstrou a importância de fazer a vida ter sentido. Ter um trabalho e cuidar de nossas crianças é muito importante, mas isso não é o propósito último da existência humana. Outros aninais — até mesmo formigas e abelhas — também trabalham e cuidam de suas crias e alguns parecem estar fazendo isso melhor do que os animais humanos… O que nos diferencia — como seres humanos — de outros animais, é a nossa inteligência elevada e a nossa capacidade especial para a prática espiritual.

Temos a capacidade de decodificar o segredo e descobrir o sentido da vida. Ao evitar ações prejudiciais e ao realizar bons feitos, podemos alcançar a felicidade nesta vida, um renascimento mais elevado na próxima ou — se realmente trabalharmos a fundo! — podemos até mesmo alcançar a perfeita iluminação. Mas precisamos de professores! E precisamos de modelos exemplares para nos ajudar no caminho.

Espiritualmente, não há limitação

É aqui onde mulheres budistas entram em cena. Se a humanidade irá sobreviver, precisaremos de toda a ajuda que pudermos.

Não podemos nos dar mais ao luxo de desperdiçar metade de nossos preciosos recursos humanos ignorando ou desvalorizando o potencial espiritual das mulheres.
Em lugar algum os textos budistas mencionam que professores devem ser de gênero masculino.

Em lugar algum o Buda afirma que ser uma mulher é resultado de mau carma, apesar de esse rumor continuar a circular em sociedades budistas. Aliás, quando o Rei Pasanadi expressou desgosto diante do nascimento de uma filha, o Buda disse que ter uma menina poderia se revelar melhor do que ter um filho homem. Quando a madrasta do Buda pediu para se juntar à ordem budista, ele confirmou que mulheres têm igual potencial para alcançar os frutos do caminho, incluindo a liberação. Dessa forma, não deveria haver nada impedindo mulheres de praticarem os ensinamentos do Buda, de atingirem realizações, e de tornarem-se os exemplos inspiradores que a humanidade precisa tão fortemente. Ao praticar as seis perfeições — generosidade, conduta ética, paciência, esforço alegre, concentração e sabedoria — mulheres podem alcançar diretamente o estado búdico. Ao desenvolver bondade amorosa, compaixão e sabedoria mulheres podem despertar e ajudar a conduzir seres sencientes para fora do sofrimento.

 

Uma vez que as mulheres configuram metade da população mundial, precisamos fazer nossa parte e ajudar a chamar a atenção para os sérios problemas que afetam a humanidade hoje.

Qualquer que seja o gênero que calhou de termos nesta vida, precisamos deixar de lado quaisquer concepções errôneas que tenhamos sobre as capacidades das mulheres e encorajá-las a tornarem-se os exemplos que precisamos ver no mundo.

Precisamos cortar qualquer pensamento equivocado que possamos ter sobre as limitações das mulheres e perceber que todos os seres humanos têm igual potencial para o despertar. Espiritualmente falando, não há qualquer limitação. Se direcionarmos nossa mente para isto, podemos purificar as delusões que nos tornam infelizes e, no lugar delas, gerar amor ilimitado por todos os seres vivos.

Em uma mente de puro amor, nenhuma escuridão pode existir. Se cultivarmos paciência, bondade amorosa, contentamento e sabedoria, então raiva, ódio, avareza, ciúme, apego, orgulho e negatividade não podem mais nos afligir. Um coração de pura compaixão é feliz, pleno e uma fonte de felicidade para os outros.

Responsabilidade compartilhada

É claro que não conseguimos purificar a mente de uma só vez. Precisamos estar constantemente alertas e atentos, momento a momento. Com a prática diária, emoções aflitivas terão cada vez menos poder sobre nós, liberando uma tremenda energia que poderemos usar para ajudar a aliviar o sofrimento dos seres vivos. Uma pessoa com uma mente pura e amorosa pode trazer benefícios ilimitados para o nosso mundo em sofrimento.

Enquanto metade da população aqui no Planeta Terra, as mulheres compartilham a responsabilidade pela transformação global, tanto quanto os homens.

Com pleno acesso aos ensinamentos libertadores do Buda, nós mulheres podemos assumir nossa responsabilidade e trabalhar para benefício do mundo, incorporando os valores de paz e amor que ele ensinou. Não há nenhum aspecto da vida contemporânea que não possa se beneficiar dos valores budistas.




Se nós, mulheres budistas, entendermos a lógica desta proposição, então deveríamos assumir nossa responsabilidade com seriedade. Trabalhar em direção à liberação para benefício do mundo é o significado mais elevado que podemos dar às nossas vidas! O compromisso do Bodisatva de trabalhar para se tornar um ser perfeitamente iluminado a fim de liberar todos os seres do sofrimento é chamado de bodhiccita. Tão logo nós geramos essa aspiração pura e perfeita, começamos a trabalhar passo a passo para chegar ao estado búdico.

De acordo com os ensinamentos Mahayana, todos os seres sencientes têm esse maravilhoso potencial. Mulheres e homens têm igualmente a semente do despertar dentro deles, apenas esperando para criar raízes. Não apenas todos os seres sencientes podem se tornar perfeitamente iluminados, como eles definitivamente irão realizar seu potencial e se tornar Budas; é apenas uma questão de tempo. Um de meus professores tibetanos disse: “A única diferença entre nós e o Buda Shakyamuni é que nós somos preguiçosos”. Já não é tempo de começarmos a fazer o trabalho duro de purificar nossas mentes e realizar este potencial?

Primeiro passo: vigilância e uso de antídotos

O primeiro passo para liberarmos a nós mesmos é desvencilhar-nos de atividades inférteis e eliminarmos as emoções que estão nos causando problemas e drenando nossa energia. Podemos conseguir isso se formos vigilantes em reconhecer e afastar as emoções negativas tão pronto elas surjam. Emoções destrutivas são nossos piores inimigos, mais perigosos do que qualquer inimigo externo. Por exemplo, quando a raiva surge, há o perigo de que ajamos a partir dela, falemos palavras que machuquem os outros, ou façamos algo que cause mal a nós ou a outros. Se permitirmos que a raiva nos tome de conta, podemos perder o controle e atacar, ou mesmo matar alguém. Precisamos estar alertas e capturar a raiva assim que ela surgir. Mesmo a prima sutil da raiva — a irritação — pode ser remediada, se usarmos a paciência.

Para tomar outro exemplo, quando o desejo surge, há o perigo de agirmos a partir dele. Podemos querer comprar itens de consumo que não precisamos, contribuindo para a degradação dos recursos da Terra e atulhando nossas casas e nossas mentes. A atração pela beleza física e o encantamento causado pelo desejo, pode nos fazer entrar em situações dolorosas. Pode nos aproximar de parceiros incompatíveis, causando grande confusão e sofrimento para nós e para os outros. Precisamos estar atentos e perceber o desejo tão pronto ele surja. Ao reconhecermos o truque da mente, podemos evitar nos enredar em situações complicadas e desagradáveis. Como disse o Buda, “O contentamento é a maior das riquezas”.


Jetsunma Tenzin Palmo, atual presidenta da organização Sakyadhita International. Foto: Buda Virtual.

 Segundo passo: ação na vida cotidiana

O segundo passo em direção a liberarmos a nós mesmos é transformar os ensinamentos do Buda em ação em nossa vida cotidiana.

Recitar os sutras e refletir sobre a bondade amorosa já não é mais suficiente. Já não seria hora de engajarmo-nos ativamente em aliviar os sofrimentos do mundo?

Isto começa em nossa própria família, vizinhança e local de trabalho, e gradualmente se estende para benefício de quem quer que esteja em necessidade. O ativismo social budista pode tomar muitas formas, desde o aconselhamento familiar até o trabalho de assistência internacional. Podemos nos voluntariar em um hospício, em um hospital prisional ou em um presídio. Podemos fazer contribuições a projetos de educação ou prestar socorro em áreas atingidas por furacões. Qualquer que seja a forma que nosso ativismo tome, é evidente que budistas precisam se tornar mais engajados socialmente em aliviar os problemas assustadores que atualmente assolam a família humana. Podemos praticar a virtude da generosidade ao oferecer nosso tempo e recursos e também enriquecer nossas mentes através da prática da compaixão. Esta é uma situação na qual todos saem ganhando.

Cuidar dos outros como prática

Teriam as mulheres maior potencial para o trabalho interno de purificar a mente e uma maior responsabilidade com o trabalho externo da ação social compassiva? Eu acredito que todos os seres humanos têm igual potencial e compartilham igual responsabilidade. No entanto, as mulheres parecem trabalhar especialmente duro.

As Nações Unidas documentaram que sessenta por cento do trabalho mundial é feito por mulheres, apesar de frequentemente elas não serem recompensadas por ele. A história prova que as mulheres são cuidadoras exemplares para seres em necessidade, ainda que sua bondade amorosa e compaixão sejam comumente desvalorizadas.

Muitas mulheres aliviam o sofrimento diário daqueles que estão doentes, fracos ou incapazes de cuidar de si próprios, ainda que suas contribuições compassivas possam ser negligenciadas ou ofuscadas pelos desejos e expectativas dos outros. É frequente que mulheres deixem de lado seu próprio desenvolvimento espiritual para poder cuidar de outros, reservando pouco tempo para a prática formal do Darma. Como podemos resolver este dilema?










Uma solução é transformar o ato de cuidar dos outros em uma prática de bodisatva.Se formos capazes de gerar a atitude de um bodisatva, toda ação compassiva pode se tornar “a prática de um bodisatva”. Mas cuidar de outros não significa que precisemos colocar nosso desenvolvimento espiritual em segundo plano. Precisamos equilibrar nosso tempo entre prática espiritual e serviço. Entender quando, onde, como e quanto praticar e como servir requer sabedoria, honestidade pessoal e, algumas vezes, coragem. Desenvolver sabedoria requer educar a nós mesmos para continuamente aprofundar nossa compreensão dos ensinamentos do Buda.

É preciso realizar os ensinamentos aqui e agora

Os ensinamentos do Buda são uma verdadeira arca do tesouro. Eles não existem simplesmente para serem entoados. Precisamos colocá-los em prática. Mulheres estão desenvolvendo a confiança de aprender e aplicar esses ensinamentos aqui e agora. Nós temos uma responsabilidade especial em despertar nossa sabedoria e compaixão e colocar em prática esses valores inestimáveis. Podemos nos inspirar em grandes praticantes, do passado e do presente, tanto homens quanto mulheres.

Hoje, um movimento global, liderado pela Associação Internacional de Mulheres Budistas Sakyadhita, está inspirando e encorajando mulheres budistas a trabalharem juntas e aperfeiçoarem seu potencial para a iluminação.

 

 A vida humana é preciosa e fugidia. Ao aproveitarmos ao máximo cada momento e trabalharmos em conjunto, o futuro pode ser brilhante. Mulheres têm, definitivamente, o poder de transformar o mundo.

Karma Lekshe Tsomo é monja budista, pesquisadora e ativista social. Atualmente é professora da Universidade de San Diego, onde ensina Budismo e Religiões do Mundo. É co-fundadora do Sakyadhita International Association of Buddhist Womene diretora fundadora da Jamyang Foundation, que apoia a educação de meninas e mulheres na região dos Himalaias.


Título original do artigo: “The Future of Women in Buddhism”
Versão para o português: Lara Albuquerque

Fonte:http://bodisatva.com.br/a-natureza-da-mente-e-a-mesma-para-todos/


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