Ego, uma perspetiva budista
No budismo, quando o Ego é referido, a palavra por vezes é mal
interpretada devido aos seus múltiplos significados. O que querem então os
budistas dizer quando se referem ao Ego?
O texto que se segue é a tradução autorizada do texto original: “Ego, A Tibetan Buddhist Perspective”, da Ven. Thubten Chodron.
“Ego” é uma palavra portuguesa ambígua com múltiplos
significados, nós devemos ter cuidado como a usamos no budismo. O seu
significado original, psicanalítico, refere-se a uma parte da mente que atua
como mediador entre os instintos animalescos do id, os valores do superego e as
demandas do mundo externo. Portanto, o ego é uma função psicológica neutra.
Posteriormente, no seio da sociedade, o “ego” passou a ser referido como o Eu
e, mais tarde, a um senso de Eu vaidoso e inflado. Nos círculos budistas, a palavra
é usada com um significado depreciativo, mas raramente é realmente definida.
Dessa ambiguidade, surge muita confusão.
Se considerarmos que o “ego” tem uma conotação negativa, pode
referir-se à ignorância do auto-agarramento que é a raiz da existência cíclica
ou à atitude egocêntrica que nos impede de desenvolver amor imparcial,
compaixão e bodhicitta (altruísmo) por todos os seres sencientes.
A ignorância do auto-agarramento, é a ignorância que não só não
é clara quanto à verdadeira natureza das pessoas e dos fenómenos (isto é, que
eles são vazios de existência independente), mas também
interpreta erroneamente a sua natureza, concebendo que ela existe sob o seu
próprio poder, independentemente, a partir do seu próprio lado. A ignorância do
auto-agarramento é contrabalançada pela meditação sobre a insubstancialidade
(anatta) e deve ser eliminada, a fim de se alcançar tanto o nirvana de um arhat como o esclarecimento
completo de um Buda.
O egocentrismo, por outro lado, não é a raiz da existência
cíclica, apesar de certamente ser um combustível das nossas atitudes
perturbadoras. É a atitude que acha que a nossa própria felicidade é mais
importante do que a de todos os outros. Na sua forma grosseira, o egocentrismo
vê a nossa felicidade comum como mais importante que a felicidade dos outros –
faz com que procuremos um pedaço de bolo antes que alguém possa obtê-lo, a nos
agarrarmos teimosamente às nossas opiniões e a ficarmos presos a sentimentos de
culpa. Na sua forma sutil, a atitude egocêntrica busca a nossa libertação
pessoal da existência cíclica sem ser compassivamente empenhada em levar outros
a libertação. O egocentrismo deve ser eliminado para que se possa alcançar a iluminação completa e é neutralizado pela
meditação sobre a equanimidade, amor, compaixão, as desvantagens do
egocentrismo, os benefícios de amar os outros e a bodhicitta.
Podemos nos perguntar: “Porque fazer distinções tão picuinhas
sobre o significado do ‘ego’ quando todos sabemos que é ruim e precisa ser
eliminado?” Se não fizermos distinção entre a ignorância do auto-agarramento e
o egocentrismo, não seremos capazes de identificá-los quando eles surgirem na
nossa mente, nem seremos capazes de aplicar os antídotos adequados a eles.
Créditos: Dharma Friendship, Sravasti Abbey, Thubten Chodron.
Esta tradução também foi publicada no thubtenchodron.org.
Esta tradução também foi publicada no thubtenchodron.org.
«Ausência do ego não significa a ausência de um eu (Self) funcional (o que
seria próprio de um psicótico e não de um sábio); significa que não estamos
mais exclusivamente identificados com aquele eu.
(…) “Sem ego” não significa “menos que uma pessoa”; significa “mais que
uma pessoa”. Não pessoa menos, mas pessoa mais – isto é, todas as qualidades
normais da pessoa mais algumas transpessoais. Pensemos nos grandes iogues,
santos e sábios – de Moisés a Cristo, a Padmasambhava. Não foram desfibrados
maneirosos, mas dinâmicos e instigantes – desde o episódio dos vendilhões do
Templo até à imposição de novos rumos a nações inteiras. Lidaram com o mundo
com os seus próprios termos, não em termos de uma piedade melosa; muitos deles
provocaram revoluções sociais significativas, que se estenderam por milhares de
anos. E assim fizeram, não porque tivessem evitado as dimensões físicas,
emocionais e mentais da humanidade, e o ego, que é o veículo de todas elas, mas
porque as assumiram com tal garra e intensidade que sacudiram as próprias
fundações do mundo.»
– Do livro “One Taste”, de Ken Wilber
«Quando você vai até um terapeuta, ele faz o quê? Vamos estruturar esta
personalidade para ela ser resiliente, resistente ao mundo, para se levantar da
crise e enxergar bem o “eu” e o “outro”. A abordagem do budismo é completamente
diversa, mas nós não dizemos que vamos aniquilar o “eu”, não é isso, pois você
precisa deste “eu” para transitar no mundo. Mas este “eu” é uma mera
construção. Vocês foram apresentados para mim agora: – “Ah, este é o monge
Genshô”. Monge é uma construção, Genshô é um nome que foi dado durante uma
ordenação por um mestre, eu não escolhi. Assim como o nome que minha mãe me
deu. Esta roupa é uma fantasia que está sendo usada há séculos, milênios,
dentro do zen. Tudo isto são construções. E elas [as construções] são úteis
para fazer esta palestra aqui e agora. Se eu entrasse sem roupa, se não tivesse
título nem nada, quem me ouviria?»

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